“Pra mim é muito difícil pensar se é possível perdoar o assassino do seu filho”, diz Débora Bloch, sobre personagem em Justiça

Publicado em 15/08/2016

E se a ficção muitas vezes se torna reflexo da realidade, Debora Bloch leva para a nova série da Globo, um drama particular. Na trama, a atriz interpreta a professora Elisa, que não é capaz de superar a morte da filha Isabela (Marina Ruy Barbosa), assassinada a tiros pelo noivo Vicente (Jesuíta Barbosa), que surta ao flagrar a amada nos braços do ex-namorado.

Apesar da condenação do acusado e o relacionamento com Heitor (Cássio Gabus Mendes), reitor da universidade onde trabalha, o desejo de vingança será maior, assim como o objetivo de fazer justiça com as próprias mãos.

Em entrevista, Debora Bloch conta que se espelhou no drama da própria faxineira, que teve o filho assassinado, para viver a personagem. De uma maneira horrível, ele foi tomar banho de cachoeira numa área da favela que era de uma outra facção e acharam que ele estava invadindo. Não houve justiça para ela. Além da tragédia que é ter enterrado um filho, nada aconteceu. Muito duro. Basicamente eu busquei mesmo no meu sentimento de mãe.”

Assunto diário das manchetes de jornais, a atriz ainda destaca sobre a impunidade de crimes no país. “O que eu acho interessante na série é que a gente fala muito na realidade brasileira. Pensando na minha faxineira, pensando nas coisas que acontecem e que ficam na impunidade, mas eu acho que tem um assunto colocado que é exatamente esse confronto entre justiça, e o que a lei decide, e o que é realmente é justiça”.

Na série, inconformada com a morte da filha, Elisa tentará com as “próprias mãos” fazer justiça. Para isso, a personagem fará aulas de tiro durante os sete anos que o assassino estiver preso. Atitude que não é defendida pela atriz. “Não dá para defender isso, porque fazer justiça com as próprias mãos seria o fim da civilização, uma barbárie total. Por outro lado eu consigo entender o sentimento de uma mãe que tem um filho assassino e fica só sete anos preso”.

Porém, ao ser questionada se perdoaria na vida real o drama vivido pela personagem, Debora Bloch dispara: “Eu não sei, quando eu penso como mãe eu acho que seria impossível pra eu perdoar. Mas a gente nunca sabe. Essas situações limites que a vida apresenta, é difícil a gente saber, o ser humano é complexo. Pra mim é muito difícil pensar se é possível perdoar o assassino do seu filho, eu acho que não. Mas talvez para outra pessoa.”

Fora do ritmo intenso das gravações, a atriz aposta no cotidiano simples para encarar a carga emocional vivida no trabalho. “Tomo um banho quente, faz uma massagem quando dá. Estou fazendo crochê também que é uma espécie de meditação.”

Confira na íntegra a entrevista com Debora Bloch

Personagem

“É um personagem trágico, né? Eu fui buscar no meu sentimento de mãe. Eu sou mãe e acho que o maior medo de toda mãe é perder um filho. E há pouco tempo a minha faxineira perdeu um filho assassinado. De uma maneira horrível, ele foi tomar banho de cachoeira numa área da favela que era de uma outra facção e acharam que ele estava invadindo. Não houve justiça para ela. Além da tragédia que é ter enterrado um filho, nada aconteceu. Muito duro. Basicamente eu busquei mesmo no meu sentimento de mãe.”

Justiça com as próprias mãos

“O que eu acho interessante na série é que a gente fala muito na realidade brasileira. Pensando na minha faxineira, pensando nas coisas que acontecem e que ficam na impunidade, mas eu acho que tem um assunto colocado que é exatamente esse confronto entre justiça, e o que a lei decide, e o que é realmente é justiça. A minha personagem, Elisa, tem a filha assassinada pelo namorado e o assassino fica só sete anos preso. E ela tem que conviver com essa tragédia, com essa dor e com essa injustiça. Mas é o que a lei determinou. Só que ela entra numa obsessão de treinar atirar durante o tempo que o assassino está preso para se vingar e fazer justiça. Não dá para defender isso, porque fazer justiça com as próprias mãos seria o fim da civilização, uma barbárie total. Por outro lado eu consigo entender o sentimento de uma mãe que tem um filho assassino e fica só sete anos preso. Considero que a Elisa está numa doença. Ela e não conseguiu se recuperar. Ela se agarra a outra coisa para poder suportar. Ela vive essa sede de justiça. Ao mesmo tempo ela é professora de direito e tem doutorado em Filosofia do Direito. E cai essa tragédia na vida dela. Toda teoria vai por água abaixo.”

Instinto de vingança

“Eu acho que ela se agarra a isso. É uma maneira de ela conviver com a perda da filha.”

Perdão pelo crime

“Eu não sei, quando eu penso como mãe eu acho que seria impossível pra eu perdoar. Mas a gente nunca sabe. Essas situações limites que a vida apresenta, é difícil a gente saber, o ser humano é complexo. E a realidade às vezes é mais surpreendente do que a gente imagina. Dentro desse contexto, a Manuela Dias (autora) me mandou um vídeo que chama humanos, tem até circulando no Facebook. São depoimentos curtos de pessoas reais. E ela me mandou um cara, americano eu acho, que estava condenado a prisão perpétua. E contando a vida dele, que tinha um padastro que batia muito nele e dizia que fazia isso porque o amava. Aí a dificuldade dele de entender que amar não tinha nada a ver com fazer mal. E ele fala que ele só entendeu o que era amor, o dia que ele conheceu uma pessoa – ele assassinou uma mãe e uma criança – o dia que ele conheceu a mãe e avó das vítimas dele, ela tinha todos os motivo para odiá-lo, mas ela não reagiu com ódio a ele. Ela foi gentil e aí ele entendeu o que era amor. Quando eu vi aquilo, pra mim foi completamente surpreendente. Perdoar o assassino da filha, é uma mulher iluminada, é uma exceção, mas existe também. Eu estou citando esse vídeo, porque me surpreendeu. Na hora que ele falou dessa mulher, veio uma emoção assim. O ser humano é bem complexo, e bem diverso. Pra mim é muito difícil pensar se é possível perdoar o assassino do seu filho, eu acho que não. Mas talvez para outra pessoa.”

Fora da realidade

O Heitor (Cássio Gabus Mendes) tenta trazer ela para a realidade. Em muitos momentos ela tá fora. Mas por outro lado é uma dor que é só dela, ela é bem solitária nessa dor. Mas ele que acolhe ela.”

Televisão e teatro

“Não é fácil. Tinha jurado que nunca mais faria isso, porque você acaba trabalhando de domingo a domingo. Reestreei a peça ‘Os Realistas’ numa sexta no Rio e gravei sábado e domingo, às 8h, e depois tinha a peça à noite. É duro, mas são trabalhos que eu queria muito fazer. Quando chego ao teatro dá uma alegria, o personagem tem um pouco de humor, reencontro aquela turma… E a minissérie tem sido muito diferente dos meus trabalhos na TV. Tem sido muito estimulante.”

Carga emocional

“Da Elisa eu saio. Quando você está fazendo um personagem assim você tem que estar o tempo todo concentrada. É uma dor muito profunda. Especialmente quando eu fiz estúdio, que eu chegava as onze e saia nove e meia da noite, quase não dava tempo nem de ir ao banheiro, e as cenas eram muito fortes. Não tem como você fica no leve, senão na hora da ação você não entrou no estado da personagem. Quando termina o dia você está pesado, parece que levou uma surra.”

Relaxar após um dia de gravação

“Tomo um banho quente, faz uma massagem quando dá. Estou fazendo crochê também que é uma espécie de meditação.”

Aulas de tiro

“Nunca tinha atirada, fiz aulas sim. Na verdade é mais fácil do que se imagina. Mas não atirei de verdade, era festim.”

André RomanoENTREVISTA REALIZADA PELO JORNALISTA ANDRÉ ROMANO

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