“A gente busca muito essa coisa da realidade”, afirma Natália Grimberg sobre os temas polêmicos de Malhação: Vidas Brasileiras

Publicado em 11/06/2018

Natália Grimberg, este é um dos grandes nomes por trás de Malhaçao: Vidas Brasileiras. Diretora artística da atração, ela conversou com nossa reportagem e falou sobre sua carreira diante, até o momento em que assumiu a atual temporada da novela. Em um mercado dominado por homens, ela acredita que o melhor tipo de feminismo é aquele mostrado na prática. A diretora ainda falou sobre o processo de escolha do elenco de Malhação, e da mudança na classificação etária, algo que não afetou a jornada de trabalho de nenhum dos envolvidos. Confira o bate papo abaixo.

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Sobre Malhação em geral, como é estar com essa galera jovem? Como é tudo isso para você sendo uma diretora artística?

O projeto dessa temporada em especial me instiga muito, porque é claro que a Malhação é um lugar onde a gente sempre descobriu talentos. É só olhar nas novelas atuais todo mundo que veio de lá. A gente tem esse compromisso, mas essa temporada em especial tem um compromisso com a realidade, de tirar o jovem das redes sociais, o que ele posta e a gente descobrir quem ele é. A gente trabalha com temáticas fortes, mas ao mesmo tempo com leveza. O negócio é achar esse equilíbrio. A gente fala sim de bullying, de assédio, de gordofobia, mas tudo de uma maneira transparente, sem vergonha não é nem de expor o jovem, mas é deixar ele desnudo.

Escolha do elenco

A gente sabe que a maioria dos atores jovens são muito completos. Como funciona essa escolha?

São mesmo, eu tenho o maior orgulho deles. Não foi uma escolha muito comum, e a Globo me apoiou muito. A gente fez um trabalho muito diferenciado nessa temporada. Eu escutei mais de 500 entrevistas pelo Brasil todo, porque afinal é Malhação: Vidas Brasileiras, eu não queria cariocas falando com sotaques de outros lugares. Eu não estava representando o Rio de Janeiro, eu estava representando o Brasil. A gente pegou jovens do Brasil todo para entrevistas pessoais, escolhemos 80, eles vieram para os estúdios Globo, e fiquei um mês com uma preparadora com eles todos os dias e aí eu chamava a autora pelo menos uma vez por semana. A gente foi inclusive mudando a história de personagens pelos atores, então eu consegui selecionar 17 atores, de 8 ou 9 Estados do Brasil diferentes.

Você falou sobre histórias pessoais, nós conversamos com eles e também sabemos de algumas, então, teve tudo a ver, não é?

Essa troca existiu desde o início. Eu tinha um personagem que cantava e eu busquei um menino que já tocasse, porque eu não precisaria ensinar o violão para ele. Precisava de um atleta e aí eu combinei com a autora de deixar o esporte em aberto, esperamos descobrir o que algum menino fazia e acabou que foi a dança.

Como está sendo ver a resposta do público através das redes sociais?

É muito legal, porque a rede social de Malhação é uma rede muito consolidada. Acredito que sejam 12 milhões de jovens e a Malhação é uma marca muito forte, tanto que a temporada que acaba sempre fica muito apegada.

Influência das redes sociais

E tem algum apelo do público na internet pedindo alguma mudança?

Não, hoje em dia é legal que eles ficam muito no tema, se a gente está falando sobre a gordofobia, sempre bomba, as redes sociais enaltecem as meninas e isso dá um orgulho danado, sabe?

Mas você se deixa influenciar pelo que você lê nas redes sociais?

Para falar a verdade, não. Eu acho que temos que estar abertos a tudo, porque a gente não sabe de onde vem. Existem críticas construtivas e críticas nem tanto, porque a pessoa que critica vai criticar qualquer coisa. A gente tem que ficar atento a qualquer coisa, mas não dá para você mudar uma estrutura porque um ou outro falou.

Você sente um peso em lançar novos rostos?

Não digo a palavra peso, porque eu acho que é a parte mais legal. Eu amo trabalhar com jovem e acho que estou no lugar certo. Eu acho que os jovens estão aí para transformar. Eu dou aula de teatro desde os 16 anos, então não é um peso. Mas eu tenho que me controlar, porque eu dou puxão de orelha, às vezes eu viro um pouco mãe. Porque imagina, para eles de repente é uma enxurrada de gente falando, de gente enaltecendo, de gente criticando, não deve ser fácil.

E você é cria de Malhação, né? Foi assistente de direção, agora como diretora artística você sente como se estivesse realizando um sonho?

Eu nunca parei para pensar nisso, mas eu acho que se em 2002 alguém me falasse que eu iria voltar aqui no lugar do Ricardo Waddington, que tinha esse cargo na época, eu iria rir. Mas a minha carreira foi construída com tanto trabalho, não foi de uma hora para outra, mas é óbvio que bate uma emoção.

Feminismo

Você como uma mulher à frente do seu tempo, rodeada de mulheres e uma Malhação protagonizada por uma grande mulher, como é para você isso tudo e mostrar esse feminismo que veio realmente para ficar?

Acho que o melhor feminismo é quando a gente está fazendo, quando a gente sai do discurso e coloca na prática. Não só o feminismo, mas como qualquer outro tema. A gente tem mulheres interessantes em cargos interessantes, a gente tem mulheres negras promovidas, eu tenho maravilhosas nessa equipe que ganharam promoção e não foi uma coisa pensada, escalar mulheres, eu queria pessoas interessantes, pessoas que amem estar aqui, porque eu amo.

Há 20 anos atrás era uma profissão dominada por homens, não é? Hoje você sendo uma mulher conduzindo essa equipe toda, dá uma honra, dá uma satisfação?

Dá, é até bonito se falar que esses dias faleceu o Roberto Farias e a última coisa que eu fiz, porque eu comecei a fazer coisas como atriz, porque com 15 anos você não sabe ainda o que você quer, ainda mais por não ter ninguém na família que trabalhasse com isso e aí eu fiz uma minissérie chamada “Contos de Verão”, eu passei 40 dias em búzios com o Roberto Farias e eu pensava que não queria estar ali, aí me falavam que era impossível e eu rebatia dizendo que eu não conhecia a palavra impossível, tanto que com 20 anos eu virei autora, assumi direção e com 27 fui promovida, porque eu nunca acreditei nessa coisa, eu achava tão bobo.

Assuntos polêmicos

Você sofreu preconceito no início, por ser uma profissão que era dominada por homens?

Eu sempre fui bem recebida, trabalhei com grandes profissionais, realmente era um outro tipo de pensamento e tal, mas isso nunca me afetou. Eu era uma mulher jovem, loira e ainda tinha aquele estereotipo da loira burra, mas eu fazia piada, levava na brincadeira, porque você vai descontraindo, eu tenho humor.

Essa temporada tem tratado e vai tratar de assuntos que são polêmicos até para o horário das 21h. Teve por exemplo a cena do terreiro de candomblé e do discurso de ódio. Como é para você tratar de um assunto que às 21h por exemplo, sofreria uma avalanche de comentários e preconceitos?

A gente busca muito essa coisa da realidade, tem uma pesquisa muito grande. A gente tem uma parceria muito grande também com a área de desenvolvimento social da TV Globo. A gente não quer camuflar. Nós conversamos muito com o pessoal com candomblé e eles sofrem muito preconceito, recebemos muitas mensagens. Eu falo sempre que é uma novela que busca o humano, o íntimo, o privado, não o estereotipo.

Como é que vocês receberam a notícia da reclassificação indicativa da novela?

Eu vou ser muito sincera, eu não recebi essa notícia. Quando a TV Globo me avisou, mudou sem nenhuma questão. Eu perguntei se havia acontecido alguma coisa, mas me disseram que não, que era uma coisa que já estava encaminhada para acontecer. Até porque as novelas que passam antes da gente, tem novelas que eram das 21h. A gente não alterou nada, não foi nem pedido, a gente vai continuar tendo os mesmos cuidados.

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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